Trombose venosa profunda da panturrilha: anticoagulação diminui risco, mas tem seu custo
Terça-feira, 16/08/2016 - Categoria: Medicina
A terapia de anticoagulação para trombose venosa profunda (TVP) de panturrilha parece diminuir o risco de embolia pulmonar (EP) ou TVP proximal em dois terços, mas quadruplica o risco de sangramento, de acordo com um estudo publicado online em 20 de julho no periódico JAMA Surgery.
"Nosso estudo pode auxiliar os argumentos para inclusão de rotina das veias profundas da panturrilha nos estudos ultrassonográficos e anticoagulação terapêutica para TVPs isoladas de panturrilha", escrevem o Dr. Garth H. Utter, da University of California, Davis, Medical Center em Sacramento, e colegas.
Tromboses venosas profundas isoladas de panturrilha, que ocorrem na veia poplítea distal, representam cerca de metade de todas as TVPs e podem contribuir para TVPs proximais mais perigosas. No entanto, não existe consenso quanto ao tratamento mais apropriado para TVP isolada da panturrilha. As abordagens incluem desde não tratar e monitorar, acompanhar com imagens seriadas, e anticoagulação. Até o momento não existem evidências de qualidade que apontem para as melhores práticas de tratamento para TVP isolada da panturrilha.
O estudo atual incluiu todos os adultos com diagnóstico ultrassonográfico de trombose venosa profunda isolada da panturrilha entre janeiro de 2010 e dezembro de 2013 no laboratório vascular da University of California, Davis. O estudo excluiu aqueles que já estavam recebendo anticoagulação ou tinham contraindicações à terapia, que tiveram tromboembolismo venoso nos últimos 180 dias, ou foram diagnosticados com embolia pulmonar no momento da primeira TVP.
A análise incluiu 384 pacientes (162 mulheres – 42,2%, 222 homens – 57,8%), com uma idade média de 60 anos. Desses participantes, os médicos tiveram a intenção de tratar 63% (n = 243) com anticoagulação; os 141 pacientes restantes serviram como grupo controle na análise. A anticoagulação incluiu varfarina (n = 182; 75,2%), heparina de baixo peso molecular (enoxaparina ou dalteparina; n = 43; 17,7%), infusão contínua de heparina (n = 15; 6,2%) e rivaroxabana ou bivalirudina (n = 1; 0,4% para cada). Dentre os 156 pacientes não destinados para receber anticoagulação indefinida e para os quais a duração da anticoagulação era conhecida, 90,5% receberam anticoagulação adequada por uma média de 106 dias.
Receber anticoagulação reduziu significativamente as chances de desenvolver uma trombose venosa profunda proximal ou embolia pulmonar em 180 dias do diagnóstico de TVP isolada de panturrilha (razão de chances, (OR) 0,34; IC de 95%, 0,14-0,83).
Dentre os pacientes não tratados, sete (5,0%) desenvolveram trombose venosa profunda proximal e seis (4,3%) desenvolveram embolia pulmonar. Dentre os pacientes tratados com anticoagulantes, quatro (1,6%) desenvolveram TVP proximal e quatro (1,6%) desenvolveram EP.
No entanto, a anticoagulação mais do que quadruplicou as chances de sangramento (razão de chances (OR), 4,35; IC de 95%, 1,27-14,9).
Após a análise de sensibilidade e ajuste para idade, sexo, ambiente do cuidado, existência de câncer, e história de TVP ou EP, os achados permaneceram praticamente os mesmos (razão de chances para TVP ou EP, 0,33 – IC de 95%, 0,12 – 0,87; razão de chances para sangramento, 4,87 – IC de 95%, 1,37 – 17,3).
Um acidente vascular encefálico hemorrágico aconteceu no grupo da anticoagulação e resultou em morte.
Os autores mencionam várias limitações, incluindo a natureza retrospectiva e observacional do estudo e a falta de indicações padronizadas para avaliação de trombose venosa profunda proximal e embolia pulmonar.
Eles concluem: "Estudos randomizados são necessários para chegar a conclusões mais certas. Por conta dos benefícios aparentemente modestos da anticoagulação, nós recomendamos atenção para o risco de sangramento ao avaliar se o tratamento com anticoagulantes é apropriado".
Convidados a comentar o estudo, os Drs. Xuan-Binh D. Pham e Christian de Virgilio, ambos daHarbor University of California, Los Angeles, Medical Center, em Torrance, escreveram que o trabalho acrescenta "informações valiosas" sobre o tratamento da trombose venosa profunda isolada de panturrilha.
Eles também apontam que aqueles com uma trombose venosa profunda muscular (sóleo ou gastrocnêmio) e aqueles com TVP provocada se beneficiam mais, e que a pesquisa é inconsistente nesse aspecto.
"Utter e colegas forneceram mais evidências de que a anticoagulação deveria ser fortemente considerada em pacientes com trombose venosa profunda muscular provocada, pois algumas TVPs de panturrilha claramente podem propagar e levar a embolia pulmonar", enfatizam. "Essa recomendação precisa ser moderada pelo fato de que a anticoagulação pode levar a um sangramento ameaçador à vida. Nós concordamos com os autores de que um estudo randomizado, prospectivo e multi-institucional é necessário para responder melhor a essa questão".
Um estudo randomizado para avaliação da eficácia da heparina de baixo peso molecular para tratamento da trombose venosa profunda distal está atualmente em curso.
Os autores e editorialistas declararam não possuir conflitos de interesses relevantes.
Fonte: Medscape